Eu nunca imaginaria que viajar para um lugar novo poderia ser tão angustiante. Era como se a estrada tivesse me levado a um país à beira do fim. As ruas estavam tomadas por terra, poeira e escombros de casas inacabadas e destruídas. Não havia asfalto, só o cimento rachado e o cheiro de abandono. Eu e minha família estávamos hospedados numa casa, ou melhor, numa promessa de lar. O tipo de casa que se vê apenas em fotos de outros tempos, quando a esperança ainda não havia partido. Estávamos em um Airbnb improvisado, que mais parecia um abrigo.
As vielas estreitas nos conduziam por um labirinto de becos em direção ao que deveria ser o nosso refúgio. O carro mal conseguia passar, o que nos obrigava a caminhar por um terreno de terra seca, com os sapatos se arrastando, pesados pela poeira que pairava no ar. A casa estava longe de ser acolhedora. As paredes desgastadas, os móveis quebrados e o cheiro de umidade se infiltrando em todos os cantos.
Minha mãe, em um esforço desesperado para manter algum contato com o mundo, trocava mensagens por meio de cartas que ficavam escondidas atrás de uma casa abandonada. Parecia que a comunicação com o exterior era um segredo, uma constante luta para não ser pega em uma rede invisível de ameaça. O tempo parecia se arrastar com um peso insuportável, e a expectativa de uma bomba ser lançada nas redondezas pairava no ar como uma sombra.
A sensação de que o fim estava por vir me consumia. O que mais me aterrorizava não era a guerra iminente, mas a casa. A casa maldita, em que os quartos estavam divididos, onde a sensação de que algo sempre estava faltando era constante. Eu sabia que não havia mais nada para fazer a não ser me trancar no quarto, o único lugar que eu ainda sentia como seguro, mesmo que aquela segurança fosse ilusão.
Entrei sozinha no quarto, o coração batendo forte no peito. A porta rangeu quando a abri, e lá estava ele. O dono da casa — ou talvez o espírito de tudo que estava errado naquele lugar — havia decidido que o quarto precisava de um guardião. No meio da cama, descansando com a serenidade de um predador, estava um leão. Um leão imenso, que se espreguiçava tranquilamente, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Seus olhos, amarelados e penetrantes, estavam fechados, mas ainda assim me fazia sentir sua presença de maneira palpável, como se ele estivesse ciente de cada movimento meu.
Eu congelei, sem saber o que fazer. O que mais poderia acontecer naquele pesadelo? Meu marido, meu filho, minha mãe — todos estavam fora do quarto, tentando se proteger da ameaça que rondava as ruas. Eu não sabia se deveria correr ou esperar, mas o leão não parecia ameaçador. Ele parecia… paciente. Como se estivesse esperando alguma ordem, como se fosse um guardião, ou talvez uma metáfora da violência iminente que nos aguardava.
O terror da situação era claro, mas o leão ali, tão sereno e imponente, trouxe uma sensação desconcertante de impotência. Eu não sabia mais o que era real. Se o leão era o maior dos perigos ou apenas mais um reflexo da desesperança daquele lugar. E então, uma pergunta me invadiu: o que mais poderia ser escondido naquele quarto, naquele país, na minha própria vida?
Eu tinha que decidir. Permanecer ali, com o leão como testemunha, ou sair para encontrar minha família, onde o abrigo era apenas uma promessa? O tempo parecia estar se esticando, e a bomba, que poderia cair a qualquer momento, parecia tão distante quanto a ideia de um futuro melhor.
Mas o leão não se mexia. Ele permanecia lá, como um lembrete constante de que, às vezes, enfrentamos nossos maiores medos não com coragem, mas com a aceitação do impossível.